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Anima e Animus – Da anatomia do desejo à imaginação desencorporada

Anima e Animus – Da anatomia do desejo à imaginação desencorporada

Liliana Liviano Wahba
Psicóloga, PhD.;docente da PUC-SP. Co-editora da Junguiana e da Psique em Foco.

Um autor que vivia apaixonado – idéias, descobertas, intuições, amores – parece, até certo ponto, ter destituído sua teoria de paixão. Jung aparentemente confirma a teoria da sublimação apesar de refutá-la.

A divergência com respeito à teoria da sexualidade e da libido de Freud o teria levado a descrever a fantasia propulsora do encontro, da paixão, em imagens destituídas de materialidade.

Anima: obsessão que contamina os humores, e animus: obsessão que contamina as convicções. Ambos derivados do desejo de amar e de ser amado, do medo de fracassar e permanecer destituído, esvaziado. Corpos entrelaçados são deslocados por imagens emblemáticas.

Por que emblemáticas, perguntamos. Ao ser confundido princípio e conteúdo, por exemplo. O animus de opiniões rígidas e dominadoras, a anima de emoções irritadiças, chorosas e vulneráveis. Perde-se nessas descrições congeladas o alcance do vislumbre ousado de Jung, o qual ele próprio, em parte, deixou de honrar.

Devido talvez a sua formação protestante, resquício do pai negado, difícil de integrar. Para contestar Freud, o ex-colega, que se recusou a ouvi-lo, Jung incorreu em outra negação e perdeu a paixão em sua teoria.

Autores como Robert Stein (1978), Rafael López-Pedraza (2000), Pierre Solié (1985), ou Carlos Byington (2001), entre outros, reescrevem a psicologia analítica conferindo-lhe corpo e substância. Anima e animus transparecem com seu fulgor original, e apontam para a essência de nossa natureza humana, a fantasia que nos impulsiona, as filigranas de nossa emocionalidade, que é tecida por um corpo que deseja e por um espírito que constrói eternas formas no vazio primordial.

São as imagens propulsoras da busca pelo outro; atirar-se ao desconhecido de nossa natureza humana, o salto na corrente evolutiva que Jung assinalou, quando conferiu à libido uma canalização diferenciada, distinta na história das espécies.
Para acompanhar Jung no seu vôo visionário e radical, a força poderosa da paixão necessita ser incorporada, encarnada, substancializada, já que, de outra forma, corremos o grande risco de perseguir quimeras.

Alma do desejo e desejo da alma fundem-se em uma unidade, mediante a qual anima e animus nos transportam no percurso de nossa evolução e resgatam a dimensão humana das fantasias – desejo, conhecimento, transcendência -, nas quais mergulhamos nossa existência.

ReferênciasBYINGTON, C.A.B. Ternura, sexo, dignidade e amor. Junguiana, n. 19, p. 79-91, 2001.LÓPEZ-PEDRAZA, R. Dionisos em exílio. Caracas: Festina Lente, 2000.SOLIÉ, P. Mitanálise junguiana. São Paulo: Nobel, 1985.STEIN, R. Incesto e amor humano. São Paulo: Símbolo, 1978.